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Coluna #Proteína Saudável – Outros olhares sobre alimentos – Modos de Preparo

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Hoje gostaria de abordar um outro assunto sobre os alimentos: os modos de preparo. O objetivo desta série de artigos nesta coluna é inspirar o leitor a expandir seu olhar para outras possibilidades, outras culturas, e quem sabe estimulá-lo a experimentar outras abordagens na hora de consumir ou preparar seus alimentos. Até porque de vez em quando é bom variar, sair da rotina, e provar algo diferente, não é mesmo?

Vamos pensar muito além dos preparos básicos que nos vêm em mente de imediato: assar, fritar com pouca gordura (também denominado saltear) ou em imersão, grelhar, refogar e ensopar.

Quando pensamos em carne bovina, imagino que o que logo vem em mente são bifes grelhados ou churrasco, certo?

A carne pode também ser empanada (o que quer dizer envolver o alimento em alguma preparação antes de fritá-lo, e aí as opções são à milanesa, à dorê e empanado duplo (ou encapotado, como no caso dos bolinhos).

A defumação é uma técnica ancestral, que era feita apenas de forma caseira até o século XV, e passou a ser realizada de maneira industrial para a conservação do arenque pescado no Mar do Norte e Canal da Mancha, já que não havia meios para conservar todo o peixe que era capturado. Os vikings, e posteriormente os portugueses e espanhóis, utilizavam os produtos defumados em suas expedições marítimas e difundiram o hábito entre os povos colonizados.

E o que fazer com uma carne mais rija? Existe a opção de amaciá-la quimicamente, de forma natural, o que pode ser feito colocando-se fatias de mamão sobre a carne (que libera papaína) ou abacaxi (que libera a bromelina), enzimas que hidrolisam os componentes estruturais da carne sem tirar seu valor nutritivo. Além disto, pode marinar-se a carne por algumas horas (usando uma vinha d’alhos), por meio de um componente ácido como vinagre ou vinho, além de sal, pimenta, alho e outros temperos, dando um sabor especial e amaciando a carne. Existe também uma forma de amaciamento física da carne, que é o uso do famoso martelo de bife ou então a tenderização feita por máquinas que fazem pequenos cortes na carne.

Chegando finalmente ao nosso tão adorado churrasco, as opções não páram por aí… O modo mais tradicional é o fogo de chão dos gaúchos, um buraco cavado no chão onde são colocadas brasas ou carvão e a carne (em geral em grande quantidade) é assada em espetos de metal ou de madeira. Pode também ser usada uma churrasqueira de tijolos dentro de casa, à lenha ou carvão. As churrasqueiras elétricas e a gás estão hoje cada vez mais comuns. E o método de nossos hermanos uruguaios e argentinos é a parrilla, aquela enorme churrasqueira onde a lenha vai sendo transformada em brasa num compartimento lateral às grelhas e a brasa quente vai sendo arrastada para baixo da grelha.

Você sabe como a carne é preparada nos luaus havaianos? O método de cozimento usa o kãlua, um tipo de forno subterrâneo. É cavado um grande buraco no chão onde são colocados a lenha, a comida a ser preparada, pedras, folhas para cobrir tudo e pedras por cima para que elas não voem. Depois de 2 a 3 horas o kãluaatinge a temperatura máxima, e então mais folhas (de bananeira ou ti, uma planta local) e uma grossa camada de terra são sobrepostas, cobrindo tudo isto, para garantir que nenhum vapor escapará. Depois de muitas horas de cozimentos as carnes estarão macias e serão servidas desfiadas no luau.

No Oriente Médio, a carne em geral é cozida lentamente num pote de barro com uma tampa cônica com um furo no alto (a tagine marroquina). Neste pote, o vapor se condensa, e como a tampa é bem ajustada, ele pinga no cozido e a carne fica deliciosamente úmida.

Algumas formas de preparo de carne são fora da cozinha, na própria mesa de refeição. É o caso dos fondues (carne frita em óleo numa panelinha na mesa), do sukiyaki (prato japonês onde as carnes, verduras e macarrão vão sendo cozidos em água na própria mesa e comidos imediatamente, e a carne grelhada em bifes na pedra vulcânica(pierrade).

A culinária do sudeste da Ásia (como a tailandesa) utiliza muito a carne em tirinhas, e faz uma fritura rasa na panela grande e funda chamada wok, além de misturá-la com legumes, massas, arroz jasmim, temperos e caldos.

A carne pode também ser moída e consumida como guisado, como hambúrguer, almôndega, bolo de carne ou como recheio de um pastel ou torta de forno, por exemplo. Alguns pratos utilizam a carne moída crua temperada(steak tartare francês ou o Hackepeter alemão), mas neste caso redobre os cuidados com a procedência e a manipulação higiênica das carnes para evitar arrependimentos.

Pode ser cortada em cubos, fincada num espetinho de bambu e grelhada intercalada com legumes, criando os espetinhos (kebabs). E como esquecer do churrasco grego, aquela montanha de carne cortada bem fininha, que fica girando num espeto, para ser cortada e colocada dentro de um pãozinho?  Delicioso.

Além disto tudo, podemos mencionar o carpaccio, lâminas cruas muito finas de carne que são consumidas frias com alcaparras, azeite de oliva e queijo ralado. O Filé a Wellington é um prato que homenageia o herói da batalha de Waterloo, e éfeito do filet mignon grelhado, envolvido com massa folhada e assado ao forno. O steak ao poivre é um filé coberto por uma grossa camada de grãos de pimenta moídos que ajudam a formar uma crosta protetora que prende os sucos da carne. A carne assada em uma grossacrosta de sal surpreendentemente não fica salgada e fica suculenta.

Você já ouviu falar em lardear e bardear? Palavrinhas esquisitas, não? Pois então. A palavra “lardon” em francês significa bacon ou toucinho. Lardear é a técnica de rechear um pedaço de carne magra com bacon, o que acaba por umedecer a carne por dentro no cozimento (você já viu o corte chamado de lagarto ou tatu recheado com bacon e legumes?). E bardear é o oposto, ou seja, cobrir a carne magra com toucinho, para umedecê-la. Quem já teve a oportunidade de ver açougues de bom padrão na Europa talvez já tenha visto uma peça de carne bem vermelha (sem marmoreio, que é aquela gordura entremeada), bem amarrada por um barbante e enrolada numa camada bem branca de toucinho. Como é frequente o abate de animais mais velhos (5 a 6 anos de idade), mais magros (pelos tipos de raças criadas, e com frequência uso de vacas de leite de descarte, bem mais velhas ainda), aquela carne bem vermelhinha e magra precisa de uma ajudinha de gordura extra para ficar macia e saborosa.

O que é, que é: fazemos uma preparação bem demorada com carne e acabamos com… nenhum pedaço de carne? São os famosos caldos, feitos a partir de uma boa quantidade de carne com osso (carne de peito, por exemplo), temperos como alho, manteiga, ervas variadas, cozimento longo e redução do caldo para usar como um “quê” de sabor para outras receitas.

Enfim: a lista não é exaustiva, pois felizmente as várias culturas do planeta criam suas receitas e modos de preparo. Se o seu apetite ainda não se abriu com tantas opções, só tenho uma coisa a lhe dizer… Que bom que para mim chegou a hora do almoço!

Fontes consultadas:

 ABC da Cozinha, Abril Cultural, 1974

L’Esprit Bistrot – Les Meilleures Recettes de Benoit, Alain Ducasse Edition, 2012

Le Cordon Bleu: Todas as técnicas culinárias. Editora Marco Zero, 2004.

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Andréa Veríssimo

Médica veterinária e Mestre em Administração Rural pela Lincoln University da Nova Zelândia. Apaixonada por carne, teve na infância vivida na fazenda de gado de corte e arroz da família o início deste fascínio, que pautou sua atuação profissional na fundação do SIC – Serviço de Informação da Carne e na promoção internacional da carne brasileira, quando gerenciou o Programa Brazilian Beef da ABIEC. Muitos churrascos para europeus, asiáticos e árabes depois (foi sempre tão bom que nem parecia trabalho!), especializou-se em public affairs ao atuar na Elanco Saúde Animal e BASF Agro e FIERGS. Mãe, esposa e hoje pecuarista no sul do Brasil, além de proprietária da Avelã Public Affairs, continua adorando aprender mais sobre tudo e explicar ao mundo urbano o que é o agronegócio, esclarecendo dúvidas e contando histórias.

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