Apresentamos no último artigo o conceito de sustentabilidade ambiental e um dos maiores desafios para a pecuária, que é mitigar as emissões de Gases de Efeito Estufa e agora vamos apresentar o que é pecuária sustentável com 5 práticas que já são realidade no país.
As principais ações que contribuem para a sustentabilidade ambiental na pecuária e provocam redução da emissão de GEE são: mudança na dieta dos animais, uso de tecnologias, manejo adequado de pastagens e melhoramento genético.
Segundo Maurício Palma Nogueira (2020), com base em dados do Rally da Pecuária, se “a pecuária brasileira aplicasse, em média, o mesmo pacote tecnológico proporcional ao aplicado na cultura da soja, a quantidade de carcaça (carne com osso) produzida por hectare saltaria de 67 kg para 510 kg por hectare / ano”.
Confira 5 práticas que contribuem para a sustentabilidade ambiental na pecuária:
1. Mudança na dieta dos animais
A alimentação do gado é um fator está relacionada à emissão de gases, como a inclusão de aditivos na dieta bovina que melhoram a sua digestibilidade e principalmente no que se refere ao tempo de abate. Dietas de alto concentrado, ou seja, ricas em grãos e alimentos não fibrosos, aumentam a conversão alimentar e os animais tendem a chegar ao peso de abate mais rapidamente.
2. Uso de tecnologia na pecuária
O uso de tecnologias e sistemas de produção integrados otimizam o uso da terra e de recursos de forma geral, como a intensificação, a Integração Lavoura-Pecuária (ILP) e principalmente a Integração Lavoura, Pecuária, Floresta (ILPF).
A intensificação consiste em utilizar os insumos da melhor forma possível, com gestão e tecnologia, melhoria de técnicas de manejo e incremento da suplementação alimentar de forma a aumentar a produtividade da produção animal (@produzidas/ha/ano).
Um estudo do Imaflora (2016) mostrou que as emissões de gases de efeito estufa (GEE) reduziu em 50% por hectare e 90% por Kg de carne produzida com a intensificação, com a reforma das pastagens e implementação das boas práticas.
A ILPF integra atividades agrícolas, pecuárias e florestais em uma mesma área, de forma a buscar efeitos sinergéticos na produção. Neste sistema, as emissões são “sequestradas” pelas florestas. Tecnicamente, a combinação de árvores com lavoura e pecuária é chamada de sistema agrossilvipastoril.
A ILPF também contribui para a conservação do solo, da água e para o bem-estar animal. O plantio adequado de árvores de forma a permitir o desenvolvimento das forrageiras, contribui para a proteção do solo contra a erosão. As raízes das arvores também colaboram para a infiltração da água no solo.
As árvores também podem favorecer o conforto térmico dos animais, que diminui a radiação solar direta com a sua sombra e potencial redução da temperatura do ar. Segundo Silva (2015), “nos trópicos, a temperatura sob a copa das árvores é cerca de 2 a 4°C menor que sob céu aberto, havendo relatos de reduções de até 9°C”.
Na sombra, o animal também “vai menos vezes ao bebedouro, apresenta melhora nas condições para reprodução (produz mais embriões) e permanece mais tempo em atividade (com reflexos na produtividade), em comparação com aquele que vive sob o sol” (MAIO, 2020).
Entre outros benefícios da ILPF também podemos citar a redução de pragas, aumento da matéria orgânica e da diversidade biológica.
A marca-conceito Carne Carbono Neutro (CNN) é uma iniciativa da Embrapa que atesta a produção realizada em sistema silvipastoril. A primeira linha de carnes com esta certificação já está disponível no mercado para o consumidor.
A Rede ILPF tem a meta de alcançar 30 milhões de hectares no Brasil em 2030, cerca do dobro da área estimada atual.
3. Manejo adequado de pastagens
Segundo estudo realizado pelo Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento da Universidade Federal de Goiás (Lapig/UFG), entre 2010 e 2018, o país recuperou 26,8 milhões de hectares de pastagens degradas, o que corresponde a uma área superior ao território do Reino Unido.
Mesmo com esta recuperação, o Brasil possui atualmente mais de 31 milhões de hectares de pastagens degradadas (60% da área de pastagens todo país).
Segundo o pesquisador Eduardo Delgado Assad, da Embrapa Informática Agropecuária “um pasto bem manejado sequestra o carbono da atmosfera, bem como o retém no solo”.
Pastagens bem manejadas absorvem até uma tonelada de carbono por hectare em um período de até 100 anos.
Neste sentido, há diversas iniciativas para a recuperação de pastagens degradas em todo o país. Recentemente também, a Embrapa lançou um curso online de recuperação de pastagens.
4. Melhoramento Genético
Cada bovino criado no Brasil produz cerca de 57 quilos de CH4 (metano) para o meio ambiente. Porém, com o aumento do desempenho animal este número pode cair em até 35%, viabilizada pela capacidade do animal de aumentar sua produção com o mesmo gasto calórico (Embrapa). Os animais que otimizam o uso de energia no corpo tendem a também reduzir o volume de dejetos excretados.
O melhoramento e a seleção genética de animais com maior desempenho contribui para esta redução e também no tempo de engorda para o abate, já que alcançam o ponto ótimo em um período menor, o que implica em menos emissões.
5. Uso de água na pecuária
Outro tema de grande relevância para entender o que é a pecuária sustentável na dimensão ambiental é o uso da água.
É verdade que são necessários 15 mil litros de água para produzir 1 kg de carne?
Esse volume de água é uma média global medida considerando toda a cadeia produtiva, da produção de insumos à oferta ao consumidor. Este valor também reflete sistemas de produção com padrão europeu e americano, nos quais o animal passa quase toda a vida em confinamento. No Brasil, mais de 90% dos animais são criados a pasto e cerca de 5% são terminados (em torno de 120 dias) em confinamento.
A Embrapa está realizando estudos para medir a pegada hídrica para produzir carne bovina no Brasil. Em uma pesquisa realizada em 17 fazendas com sistema de confinamento no Estado de São Paulo, a pegada hídrica média foi de 5.718 litros por quilo de carne. A pegada azul representou 15% deste valor e a verde 85% (EMBRAPA, 2017).
“Para o cálculo, foi considerada a somatória da pegada azul − água usada na dessedentação, no processamento dos alimentos da ração e embutida no produto − e da pegada verde, com base nos dados locais de cada fazenda, que registram a precipitação diária, produtividade da cultura vegetal e sua evapotranspiração”.
Pegada hídrica na pecuária
A pegada hídrica depende de diversos fatores como condições climáticas, desempenho animal e produtividade da cultura agrícola utilizada. Neste estudo em questão, um aumento de produtividade representou uma redução de 19,4% na pegada.
Porém o elemento que mais impacta é a alimentação dos animais. O manejo nutricional dos animais tem apresentado diferenças nos cálculos da pegada hídrica. Os confinamentos que utilizaram quantidades maiores de concentrado na dieta demandaram mais água por quilo de carne produzido, enquanto os menores valores da pegada foram relacionados a percentagens elevadas de volumoso nas dietas dos animais. O volumoso corresponde a cana picada, bagaço de cana ou silagem de milho.
“A utilização de subprodutos na alimentação animal pode reduzir os valores da água, bem como pegadas ecológicas ou de carbono, já que apenas parte da água consumida pelo produto principal é alocada ao subproduto” (EMBRAPA, 2017).
A final, a pecuária é sustentável?
Responder esta pergunta com um sim ou não é básico demais para a complexidade do setor. A indústria têxtil é sustentável? E a automobilística?
Quando tivermos indicadores de sustentabilidade ambiental, social e econômica com dados atualizados e confiáveis, vou poder responder a questão com embasamento.
Hoje, digo que a pecuária caminha para ser cada dia mais sustentável, com um esforço enorme de pecuaristas, associações, cooperativas, pesquisadores e organizações do setor público e privado que atuam com ciência e inovação para aumentar a produtividade otimizando recursos.
Além de tudo que foi citado neste artigo, há outras formas de tornar a pecuária ainda mais sustentável a nível ambiental, como o plantio direto e a fixação biológica do nitrogênio na produção de grãos para a ração fornecida aos animais, além do Tratamento de Dejetos de Animais (TDA).
Também não cheguei a mencionar sobre as novas tecnologias protagonizadas pelas AgTechs que chegam para somar no caminho de uma pecuária mais sustentável.
Este artigo trouxe uma análise geral de como ações focadas na sustentabilidade ambiental podem ser realizadas na produção pecuária.
Sabemos que há ainda muitos desafios a serem enfrentados, sociais e econômicos, como os de governança, uso do solo e da terra, políticas de crédito ao produtor, e também os relacionados à participação de cada agente envolvido na produção.
É preciso que a sustentabilidade seja uma visão sistêmica de toda a cadeia produtiva, da genética ao consumidor. Todos possuem seu papel e responsabilidade em agir considerando as práticas sustentáveis do tripé social, econômico e ambiental.
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Uma parceria de propósitos
Este artigo é uma parceria do Blog da Carne com a Elanco Saúde Animal e parte de uma série de conteúdos sobre boas práticas e sustentabilidade na pecuária.
Quer conhecer mais práticas ambientais na pecuária?
Confira o Manual de Práticas para a Pecuária Sustentável do GTPS
Referências
EMBRAPA. Estudos indicam pegada hídrica de bovinos em confinamento no Brasil. 2017. https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/21518151/estudos-indicam-pegada-hidrica-de-bovinos-em-confinamento-no-brasil> Acesso em: 07 de jan. 2021.
IMAFLORA. Boas práticas agropecuárias reduzem as emissões de GEE e aumentam a produção de carne na Amazônia. Piracicaba, SP. 2016. Disponível em: < https://www.pecsa.com.br/wp-content/uploads/2017/02/Boas-Praticas-Agropecu%c3%a1rias-Reduzem-as-Emiss%c3%b5es-da-Pecuaria-de-Corte-na-Amazonia_IMAFLORA.pdf >. Acesso em 12 jan. 2021.
MAIO, A. Pecuária de Corte 4.0. Revista Pecuária. Março/Abril 2020.
NOGUEIRA, M. P. Consumir carne é sustentável? Canal Agro Estadão. Disponível em:< https://summitagro.estadao.com.br/agro-no-brasil/colunistas/consumir-carne-e-sustentavel/>. Acesso em 12 jan. 2021.
Foto de Capa
Gabriel Rezende Faria (Embrapa) – Fazenda Gamada, em Nova Canaã do Norte (MT)
Juh Chini
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