Achei esse texto tão bom e explicativo que achei prudente compartilhar na íntegra com vocês. Crédito no final.
A qualidade e o rendimento da carne bovina podem ser bastante afetados após o abate do gado. Existem duas variáveis principais a serem levadas em conta para obter uma boa qualidade microbiológica e um ótimo rendimento: temperatura e contaminação. O modo como essas variáveis é gerenciado nas diferentes etapas do processamento será a diferença entre o sucesso ou o fracasso da operação.
Gerenciamento de temperaturas e cadeia fria
A cadeia fria tem início quando as carcaças de boi são colocadas na área de resfriamento, e, para o processador, termina quando o produto cárneo é disposto nas gôndolas dos estabelecimentos de venda.
Quando as carcaças acabem de sair da sala de resfriamento, deve-se tomar cuidado para que haja espaço suficiente entre elas a fim de permitir a circulação de ar em volta delas. Quando as carcaças são posicionadas muito próximas umas das outras, ou quando ficam coladas umas com as outras, levará mais tempo para que esfriem, o que aumenta a perda evaporativa e afeta o rendimento, além de que o meio se tornará mais propício para o crescimento bacteriano. Outro aspecto a ser considerado é o tamanho das carcaças. Se as carcaças colocadas na área de resfriamento forem de animais de pesos variáveis, de grande porte ou muito pequenos, as carcaças menores esfriarão mais rapidamente do que as maiores, obtendo-se, também, resultados diferentes de rendimento e qualidade microbiana.
A técnica tradicional de resfriamento de carcaças de boi indica que estas devem alcançar uma temperatura interna de 7°C em 48 horas. Essa técnica normalmente apresenta perdas evaporativas de 2,5%. Também existe o resfriamento rápido, que faz com que as carcaças atinjam os mesmos 7°C em 24 horas, mas essa técnica requer que a área de resfriamento esteja a uma temperatura de 1°C. O problema aqui é a provável ocorrência do fenômeno de “encolhimento decorrente do frio” nas carcaças, embora isso possa ser melhorado com estimulação elétrica. No resfriamento rápido, a perda de rendimento é menor que 1,5%. Existe outra modalidade de resfriamento de carcaças que é conhecida como “resfriamento com aspersão”, na qual se aplica água (que pode ser clorada, para diminuir o crescimento bacteriano) por meio de aspersão através de bocais instalados na área de refrigeração. A aspersão é realizada intermitentemente e observou-se que ela diminui significativamente o risco de contaminação. Deve ser aplicada uma ou duas horas antes que as carcaças atinjam a temperatura-alvo de resfriamento a fim de propiciar tempo para que suas superfícies sequem e não apresentem problemas de aspecto externo devido à umidade. As salas de resfriamento de carcaças devem ser mantidas com umidade relativa de 90% a 95% para diminuir a perda por umidade.
Uma vez resfriadas as carcaças, estas passam para a sala de desossa. Algumas são distribuídas inteiras, sem que estejam fragmentadas. Em qualquer um dos casos, a temperatura das áreas e da carne deverá ser sempre monitorada, constantemente, para garantir a qualidade microbiológica e para que o rendimento não seja afetado gravemente devido à perda de umidade.
Se a temperatura de refrigeração das carcaças se mantiver abaixo de 4°C, a sala de corte pode, portanto, ser mantida a 15°C sempre e quando o tempo de realização de cortes não exceder duas horas. Os pedaços, no entanto, têm que voltar à refrigeração em menos de 1 hora.
Uma vez embalados os cortes ou produtos de carne fresca, estes devem ser novamente refrigerados e mantidos a uma temperatura de 2°C com o máximo de constância possível. Durante o transporte dos produtos frescos embalados, os caminhões devem manter uma temperatura de 0°C (lembre-se que o ponto de congelamento da carne é de -2°C, pois essa temperatura manterá os produtos frescos e não congelados). As gôndolas dos estabelecimentos de venda devem manter uma temperatura máxima de 4°C.
É preciso salientar que, durante todos os traslados das carcaças, cortes e pacotes de carne fresca, os períodos de tempo de transporte devem ser mantidos o mínimo possível para evitar grandes oscilações de temperatura na carne, e a temperatura de cada etapa de toda essa cadeia deve ser monitorada como parte do sistema de qualidade.
Diminuindo os riscos de contaminação
Os riscos associados à contaminação da carne por bactérias (decompositoras e patógenas) estão presentes o tempo todo durante o processo produtivo: desde os currais, passando pelo transporte à planta e ao abate, até o processamento posterior, distribuição e venda dos produtos. Para efeitos deste artigo, vamos nos deter na etapa de resfriamento das carcaças até a venda no varejo dos produtos.
Anteriormente, mencionamos que a temperatura é um fator de suma importância para o controle de qualidade microbiológica da carne. Levando em conta que a temperatura está adequada em cada etapa do processo, o processador pode tender demais a fazer uso de intervenções químicas para diminuir a carga bacteriana das carcaças, o que, no final, resultará em produtos frescos com cargas bacterianas baixas. Uma vez que as carcaças estão enxutas (com água potável, com temperatura entre 32°C e 48°C), e antes que entrem na área de resfriamento, é extremamente recomendável tratá-las com alguma solução antimicrobiana. Para isso, as práticas mais recomendáveis e comumente aplicadas são:
• Enxágue com ácido lático – é aplicado por aspersão, duas vezes na carcaça, com uma solução de 2,5% (concentração máxima recomendada) de ácido lático em água, sendo que a variação de temperatura ambiente vai até 54°C. Quando maior for a temperatura, mais eficiente será o tratamento;
• Enxágue com ácido acético (vinagre) – é aplicado por aspersão, duas vezes na carcaça, com uma solução de 2% (concentração máxima recomendada) de ácido acético em água, com uma temperatura que não deverá ultrapassar os 54°C; semelhantemente ao tratamento anterior, será mais eficaz se a temperatura for maior;
• Enxágue com água quente – é aplicado duas vezes na carcaça com uma mangueira, com variação de temperatura da água de 65°C a 82°C. Esta intervenção pode causar problemas de condensação no local em que é aplicada.
Outro composto utilizado algumas vezes como intervenção é o cloreto acidificado de sódio (CAS), cuja vantagem é não possuir odores residuais de cloro devido a sua rápida decomposição, e, por isso mesmo, apresenta uma desvantagem: deve ser preparado justamente antes de aplicado para garantir sua eficácia como antibacteriano. A dose recomendada é de 300 ppm.
Na área destinada ao corte da carne, é de extrema importância contar com ótimas práticas de higiene. Os funcionários que trabalham nessa área devem estar bem treinados para manusear os alimentos higienicamente; além disso, suas ferramentas de trabalho também devem estar impecáveis em termos de limpeza, já que qualquer manuseio inadequado da matéria-prima e das ferramentas de trabalho poderá afetar a qualidade microbiológica do produto final.
Nas áreas de corte, além de monitorar corretamente a temperatura do ambiente e a matéria-prima, deve-se dispor de um programa específico de higienização, que leve em conta o uso de antimicrobianos especiais para tratar as superfícies que estiverem em contato direto com a carne, incluindo as ferramentas de trabalho, como facas e serras, e aventais de malha metálica dos funcionários.
Em relação às intervenções químicas, uma das mais eficazes e comprovadas é a aplicação de ácido lático. Para a carne bovina, em cortes primários ou subprimários, incluindo os recortes e carne moída, recomenda-se aplicar uma solução (aspersão) com concentração de 2% a 5%, a uma temperatura que não ultrapasse os 55°C. O uso de lactoferrina vem sendo bastante estudado, tendo apresentado ótimos resultados, e sua aplicação (por aspersão) é recomendada para cortes de carne como uma solução de até 2% de concentração. Outros ácidos orgânicos foram relatados como eficazes em cortes e recortes de carne bovina; dentre eles, estão o ácido peroxiacético (220 ppm) e o peróxido de hidrogênio (75 ppm).
Após o corte, os produtos frescos de carne bovina são embalados em embalagens diferentes e variadas. Para alguns produtos, uma embalagem simples de bandeja e revestida com plástico é a mais adequada, enquanto que, para outros produtos, o embalo em atmosfera modificada, ou o embalo a vácuo serão mais apropriados. Existem inovações recentes em termos de filmes plásticos que contêm antimicrobianos naturais para propiciar mais qualidade microbiológica à carne fresca, e a modificação da atmosfera é uma ferramenta bastante eficiente para controlar micro-organismos. Além disso, a embalagem protege a carne de perdas por evaporação, pois beneficia o rendimento cárneo do produto.
Uma vez embalados os produtos de carne fresca, estes estarão protegidos contra qualquer contaminação externa, mas o controle de temperatura deve estar sempre presente para garantir que as prováveis bactérias presentes no produto embalado não consigam se multiplicar antes que o produto seja devidamente cozido e consumido.
Texto de: Ana Elia Rocha McGuire
Fonte: CarneTec
Melina Cais
Latest posts by Melina Cais (see all)
- Aussie Grill revela detalhes de seus molhos exclusivos - maio 10, 2022
- Tripé: a dimensão da sustentabilidade social na pecuária - dezembro 17, 2020
- Preço da carne bovina: por que e até quando? - dezembro 2, 2019