O início do mês de outubro nos brinda com o final do primeiro trimestre produtivo, sob a óptica da análise baseado no “ano safra”, isto é, de julho a junho. Por outro lado, se a avaliação da produção pecuária for realizada de acordo com o “ano civil”, janeiro a dezembro, significa que estamos adentrando o fim do ano, o último trimestre. As duas formas de observar o mesmo momento trazem à tona discussões relevantes dentro da porteira, momento de se parar um pouco, olhar ao mesmo tempo para trás e para o futuro, refletir, tomar decisões e seguir a caminhada.
Se estamos no final do ano civil, e é assim que boa parte das pessoas enxergam, parar a caminhada e olhar para trás significa lembrar de 9 meses passados de muita pedra e desvios no caminho, de política e economia em dissonância. Sim, foi um ano duro para os produtores de carne, com crise de ânimos e confiança. Portanto, quem preparou bem a matula e a caixa de ferramentas e esteve com mapa e números nas mãos conseguiu amenizar os efeitos do mercado e, em alguns casos, quando o saldo da guaiaca permitiu, pôde comprar animais na baixa, medida estrategicamente positiva tendo em vista a futura retomada dos preços.
Ao olhar para o futuro, nos próximos 3 meses finais do ano civil, o pecuarista já vê no horizonte os efeitos da chuva que tardou,mas chegou. Vê anúncios de preços futuros do boi gordo em ascendência e vê, mais uma vez, que crises vêm e vão, são parte da caminhada e de alguma forma nos ensinam e nos fortalecem. Enxerga também que é sempre importante estar com uma boa armadura e um arcabouço de informações para enfrentá-las, sem perder a confiança e o brio, afinal a carne é forte.
Sob o prisma do ano safra, estamos encerrando o primeiro trimestre, um primeiro acumulado de informações produtivas e financeiras para avaliação de como foi a arrancada. A produção de carne ao longo da safra é cruzar um rio de águas conhecidas, porém sempre com rebojo, curvas e logradouros, sendo imprescindível foco e disciplina conforme as remadas. Deslizes identificados logo no começo terão mais tempo para serem corrigidos, permitindo a adequação da rota em tempo hábil. Esse primeiro encerre trimestral apresenta como foi o desempenho na seca, escancarando nossa exigência de produção no verão para alcançar a meta geral. Traz os olhos para uma maior atenção à pastagem, que por ser tropical retoma agora seu crescimento sob dias mais quentes e longos. Trata-se de ponto fundamental para a produção de carne, que mais de 90% vem de animais a pasto.
Nos próximos 3 trimestres é quando começamos a dar nomes às matrizes que entrarão em reprodução, futuras mães dos nossos bezerros, aos touros que serão os reprodutores e patriarcas do rebanho e aos bois que rumam à terminação para produzir as picanhas e costelas das festas de final de ano. É tempo de equilibrar a boa e velha canoa no início da travessia do rio, atento a correntezas e bancos de areia, livrando-se de pesos desnecessários e organizando a carga para não tombar. De uma margem para outra temos muito a levar, não basta chegar a quaisquer custas, mas sim alcançar o outro lado melhor do que saiu.
Sob qualquer uma dessas duas formas de analisar, a atividade pecuária, a produção de carne dentro da porteira, imita a nossa vida cotidiana, pois estamos sempre em trajeto, jornada ou travessia, sujeitos aos efeitos do tempo e das nossas próprias decisões. Como bem disse Guimarães Rosa “a vida é assim: esquenta e esfria, aperta daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”.
José Pádua
Especialista em Produção e Nutrição de Ruminantes pela Esalq-USP, Médico Veterinário pela Unesp-Jaboticabal, Consultor-sócio da Terra Desenvolvimento Agropecuário, Membro da Comissão Jovem da Famasul-MS.
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Excelente reflexão